Uma proposta apresentada no Conselho Provincial de Trento reacendeu o debate sobre a cidadania italiana para os descendentes de trentinos que emigraram antes da anexação da região à Itália, em 1918.
O pedido solicita ao Parlamento e ao governo da Itália que reabram o prazo da Lei n. 379 de 2000, permitindo o reconhecimento da cidadania por descendência para filhos, netos e bisnetos de trentinos que partiram rumo à América do Sul, sobretudo para o Brasil, Argentina e Uruguai.
Segundo o documento, a lei atual – modificada pelo Decreto-Lei n. 36 de 2025, convertido na Lei n. 74 – tornou o acesso à cidadania praticamente inviável para a maioria desses descendentes. As novas regras restringem o reconhecimento apenas a quem tenha pai ou avô nascido na Itália, ou pai residente por dois anos no país antes do nascimento do filho.
Herança cultural em risco
A proposta recorda que, apesar de terem nascido sob domínio austro-húngaro, os emigrantes trentinos levavam consigo cultura, idioma e tradições italianas. A cidadania italiana vinha sendo reconhecida a seus descendentes por meio de legislações baseadas no princípio do ius sanguinis – o direito pela ascendência.
Entre as normas citadas estão a Lei n. 555 de 1912, que reconhecia a transmissão paterna da cidadania, e a Lei n. 91 de 1992, que reafirma esse direito para filhos de cidadãos italianos, sejam eles mãe ou pai.
Um apelo ao vínculo com os trentinos no exterior
O documento destaca que a medida atual exclui mais de 99% dos descendentes de trentinos que vivem hoje no Brasil. Para os autores da proposta, essa exclusão representa uma injustiça histórica e compromete o vínculo entre a região e milhares de famílias que ainda mantêm vivas as tradições trentinas no exterior.
“Não se trata apenas de uma questão jurídica, mas de identidade, memória e justiça histórica”, diz o texto, que conclui pedindo o reconhecimento do valor cultural e histórico das migrações trentinas e a retomada do direito à cidadania italiana para seus descendentes.
Texto da proposta de voto (traduzido):
Entre o final do século XIX e as primeiras décadas do século XX, milhares de homens e mulheres deixaram os vales do Trentino, impulsionados pela pobreza e pela falta de oportunidades. Partiram com coragem, atravessando o oceano para construir uma nova vida na América do Sul, sobretudo no Brasil, na Argentina e no Uruguai.
Embora tenham nascido sob outro Estado, levavam consigo a língua, a cultura, as tradições e um profundo senso de pertencimento à civilização italiana. Após a anexação do Trentino à Itália, ocorrida em 1918, o Estado italiano reconheceu ao longo dos anos o direito à cidadania dos descendentes desses emigrantes, por meio de uma série de leis baseadas no princípio do ius sanguinis, ou seja, a cidadania por descendência.
Recorda-se que já em 1912, com a Lei nº 555, o Reino da Itália estabelecia o princípio da transmissão da cidadania por via paterna e, em 1983, com a Lei nº 123, afirmava-se finalmente a igualdade entre mãe e pai na transmissão da cidadania. Em tempos mais recentes, em 1992, a Lei nº 91, atualmente em vigor, estabeleceu em seu artigo 1º que “é cidadão por nascimento o filho de pai ou mãe cidadãos italianos”, reafirmando com clareza o ius sanguinis, e o Decreto do Presidente da República nº 572 de 1993 tornou essas disposições operacionais em nível administrativo.
Mas não apenas isso. Com a Lei nº 379 de 2000, o Estado italiano também reconheceu o direito à cidadania para os descendentes daqueles que nasceram nos territórios que pertenciam ao Império Austro-Húngaro, como o nosso Trentino, desde que declarassem essa vontade. Esse reconhecimento foi um ato de justiça histórica. O mesmo espírito animou a Lei nº 124 de 2006, que estendeu o direito também aos descendentes dos italianos da Ístria, de Fiume e da Dalmácia.
Até 2010, a República considerou, com justiça, que não era a nacionalidade formal no momento do nascimento do antepassado que determinava a italianidade, mas sim a identidade cultural, linguística e familiar.
Infelizmente, hoje tudo isso está sendo posto em discussão. As modificações introduzidas em 2025, com o Decreto-Lei nº 36, posteriormente convertido na Lei nº 74, impõem novos requisitos: a cidadania por descendência será reconhecida apenas se houver um pai ou avô nascido na Itália, ou se o pai tiver residido em território italiano por pelo menos dois anos antes do nascimento do filho.
Essa medida, aparentemente técnica, exclui de fato quase a totalidade dos descendentes dos emigrantes trentinos do final do século XIX e início do século XX. Basta pensar que no Brasil, segundo estimativas confiáveis, mais de 99% dos cidadãos de origem trentina descendem de pessoas que emigraram antes de 1918.
Essa situação parece, portanto, profundamente injusta, pois elimina um direito que durante décadas foi reconhecido e respeitado. Sobretudo, corre o risco de romper o vínculo vivo e autêntico que ainda hoje une o Trentino a milhares de famílias ao redor do mundo que se sentem trentinas, que falam nossos dialetos, que celebram nossas tradições, que carregam com orgulho a memória de seus avós.
Como Instituição autônoma e consciente de sua própria história, temos o dever de exigir com firmeza que seja reaberta a janela normativa para o reconhecimento da cidadania italiana iure sanguinis também aos descendentes dos trentinos nascidos sob o Império Austro-Húngaro, assim como foi possível até 2010.
Não se trata apenas de uma questão jurídica, mas de identidade, memória e justiça histórica. E o Trentino não pode virar as costas para aqueles que, mesmo distantes, jamais deixaram de se sentir parte da nossa comunidade.
Diante de tudo isso, o Conselho Provincial da Província Autônoma de Trento, nos termos do artigo 35 do Estatuto de Autonomia, solicita ao Parlamento e ao Governo italiano que reabram o prazo para o pedido de cidadania italiana conforme a Lei nº 379 de 2000, a fim de que sejam reconhecidos o valor histórico, cultural e identitário dos fluxos migratórios trentinos e a importância do vínculo com as comunidades de descendência italiana no mundo.
Il testo della proposta di voto
Tra la fine dell’Ottocento e i primi decenni del Novecento, migliaia di uomini e donne lasciarono le valli del Trentino, spinti dalla povertà e dalla mancanza di opportunità. Partirono con coraggio, attraversando l’oceano per costruirsi una nuova vita in Sud America, soprattutto in Brasile, Argentina e Uruguay. Sebbene nati sotto un altro Stato, portavano con sé la lingua, la cultura, le tradizioni e un profondo senso di appartenenza alla civiltà italiana. Dopo l’annessione del Trentino all’Italia, avvenuta nel 1918, lo Stato italiano ha riconosciuto negli anni il diritto di cittadinanza ai discendenti di questi emigrati attraverso una serie di leggi fondate sul principio dello ius sanguinis, ovvero la cittadinanza per discendenza.
Ricordo che già nel 1912, con la Legge n. 555, il Regno d’Italia stabiliva il principio della trasmissione della cittadinanza per via paterna e nel 1983, con la Legge n. 123, si affermava finalmente la parità tra madre e padre nella trasmissione della cittadinanza. In tempi più recenti, nel 1992, la Legge n. 91, attualmente in vigore, ha sancito all’articolo 1 che “è cittadino per nascita il figlio di padre o di madre cittadini italiani”, ribadendo con chiarezza lo ius sanguinis e il D.P.R. n. 572 del 1993 ha poi reso operative queste disposizioni a livello amministrativo.
Ma non solo. Con la Legge n. 379 del 2000, lo Stato italiano ha riconosciuto anche il diritto alla cittadinanza per i discendenti di coloro che erano nati nei territori già appartenenti all’Impero austro-ungarico, come il nostro Trentino, a condizione che ne dichiarassero la volontà. Questo riconoscimento è stato un atto di giustizia storica. E lo stesso spirito ha animato la Legge n. 124 del 2006, che ha esteso il diritto anche ai discendenti degli italiani dell’Istria, di Fiume e della Dalmazia. Fino al 2010, la Repubblica ha quindi giustamente considerato che non fosse la nazionalità formale al momento della nascita del proprio antenato a determinare l’italianità, ma piuttosto l’identità culturale, linguistica e familiare.
Purtroppo, oggi tutto questo è messo in discussione. Le modifiche introdotte nel 2025, con il Decreto-Legge n. 36, poi convertito nella Legge n. 74, impongono nuovi vincoli: la cittadinanza per discendenza sarà riconosciuta solo se si ha un genitore o un nonno nato in Italia, oppure se il genitore ha risieduto nel territorio italiano almeno due anni prima della nascita del figlio.
Questa misura, apparentemente tecnica, di fatto esclude la quasi totalità dei discendenti degli emigrati trentini di fine Ottocento e inizio Novecento. Basti pensare che in Brasile, secondo stime attendibili, oltre il 99% dei cittadini di origine trentina discende da persone emigrate prima del 1918.
Questa situazione appare dunque profondamente ingiusta, perché cancella un diritto che per decenni è stato riconosciuto e onorato. Soprattutto, rischia di spezzare il legame vivo e autentico che lega ancora oggi il Trentino a migliaia di famiglie nel mondo che si sentono trentine, che parlano i nostri dialetti, che celebrano le nostre tradizioni, che portano con fierezza la memoria dei loro nonni.
Come Istituzione autonoma e consapevole della propria storia, abbiamo il dovere di chiedere con forza che venga riaperta la finestra normativa per il riconoscimento della cittadinanza italiana iure sanguinis anche ai discendenti dei trentini nati sotto l’Impero austro-ungarico, così come è stato possibile fino al 2010.
Non si tratta solo di una questione giuridica, ma di identità, memoria e giustizia storica. E il Trentino non può voltare le spalle a chi, pur lontano, non ha mai smesso di sentirsi parte della nostra comunità.
Tutto ciò premesso il Consiglio provinciale della Provincia Autonoma di Trento, ai sensi dell’articolo 35 dello Statuto di autonomia sollecita il Parlamento e il Governo italiano a riaprire la finestra per la richiesta di cittadinanza italiana ai sensi della Legge n. 379 del 2000, affinchè vengano riconosciuti il valore storico, culturale e identitario dei flussi migratori trentini e l’importanza del legame con le comunità di discendenza italiana nel mondo.
