Símbolo do drama que chegava à Europa, agora país lida melhor do que vizinhos. Cautela e rigor
Hospitais à beira do colapso, violência nos supermercados e medidas sem precedentes para conter o vírus.
Porta de entrada da pandemia na Europa, a Itália foi o símbolo daquilo que podia dar errado na resposta ao Covid-19.
Milão, uma das cidades mais vibrantes da Europa tornou-se um ícone da devastação transformadora da pandemia.
A experiência italiana ajudou o resto da Europa a se preparar melhor para o pico da propagação da doença.
Agora, entretanto, o país que no início mais sofreu com o coronavírus se mostra um dos mais bem-sucedidos na prevenção da segunda onda.
Enquanto a Itália tem registado números na ordem dos 1.500 novos casos por dia (tendo alcançado um máximo de 1.907 casos num só dia), países como Espanha e França, mas também o Reino Unido, contabilizam números consideravelmente superiores.
Na França, os valores estão na ordem dos 10 mil novos casos por dia (com um máximo recente acima dos 13 mil). Já em Espanha, os números estão ainda mais acima, com uma média superior a 11 mil casos por dia (e já chegou a registar 31 mil casos num só dia).
Mais abaixo, o Reino Unido tem registado cerca de 4 mil casos novos por dia, o dobro de Itália.
As lições do sistema de saúde, a antecipação das medidas e o controle rígido do cumprimento das normas explicam o sucesso do país, acreditam os especialistas.
“O confinamento atempado, rigoroso e prolongado funcionou melhor aqui na Itália do que em outros países que hesitaram em fechar, que fecharam menos e que reabriram mais cedo”, afirmou recentemente ao The Local, o especialista em saúde pública Nino Cartabellota..
Rigor nas decisões
O segredo parece mesmo ter sido a antecipação na adoção de hábitos.
A Itália foi o primeiro país a colocar em prática um confinamento rigoroso dos cidadãos: na primeira semana de março, o primeiro-ministro Giuseppe Conte anunciou que o país ficaria totalmente isolado do resto do mundo e que os cidadãos só poderiam sair de suas casas em situação de extrema necessidade ou para comprar mantimentos (tinham até de preencher um documento oficial a comprovar a necessidade da saída).
Porém, mais importante do que a decisão de fechar antes foi a decisão de reabrir mais tarde.
Mesmo tendo sido o primeiro país a fechar serviços e a restringir as liberdades dos cidadãos, a Itália tem sido mais cautelosa do que outros países no processo de reabertura.
Um dos exemplos mais significativos é o das escolas, que só reabriram na Itália no dia 14 de setembro, para o novo ano letivo. No outros países, a reabertura aconteceu antes.
Na França, muitos estabelecimentos de ensino reabriram durante o mês de maio, numa altura em que o país ainda registava mil casos de Covid-19 por dia.
Doeu no bolso
O cumprimento das regras por parte dos italianos deveu-se à implementação, desde muito cedo, de um sistema de penalizações a todos os que não respeitassem o isolamento.
Logo no início de março, quando o governo italiano decidiu que os cidadãos deveriam ficar em casa exceto para as atividades estritamente necessárias, estabeleceu que quem não cumprisse as normas seria multado — e a polícia foi rigorosa.
Na primeira semana foram registradas quase 30 mil multas. Em um sábado no início de abril, as autoridades chegaram a um recorde de 9.300 multas num só dia.
Na região da Lombardia, a mais afetada pela pandemia, as autoridades tornaram o uso de máscara obrigatório nas ruas e a falta de cumprimento da regra valia uma multa de 400 euros.
Sistema de saúde “mais forte”
Em paralelo com a implementação de medidas rigorosas, os especialistas apontam as aprendizagens do sistema público de saúde italiano na primeira fase da pandemia, que permitiram ao país pôr em prática procedimentos eficazes de rastreio e testagem da população.
“Sempre que há um teste positivo, testamos todos aqueles que possam ter estado em contato com ele. O verdadeiro problema desta epidemia são os casos sem sintomas. Se não os interceptamos, não saímos dela”, explicou Andrea Crisanti ao Financial Times.
Segundo as autoridades italianas, mais de dois terços dos italianos que foram diagnosticados com a doença não foram identificados por ter sintomas, mas através do sistema de rastreio implementado no país — incluindo através da aplicativo “Immuni”.
“Ao identificarmos rapidamente os novos positivos, com a ajuda dos departamentos de saúde, controlamos os novos surtos isolando todos os contatos próximos”, disse ao The Telegraph o consultor de saúde pública da região da Emilia-Romagna, Raffaele Donini.
Em entrevista recente ao jornal La Stampa, o ministro italiano da Saúde, Roberto Speranza, assegurou que o serviço nacional de saúde “ficou muito mais forte” desde o início da pandemia, tendo duplicado o número de leitos para os cuidados intensivos. “Estou otimista, embora prudente”, afirmou, assegurando que o país não será sujeito a um novo confinamento.
Até ao momento, já foram diagnosticados 302.537 casos de Covid-19 na Itália, O número de mortes é de 35.758 pessoas.
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Com informações do Observador, La Stampa, The Local