O Dante Alighieri foi a primeira grande instituição de ensino dos imigrantes italianos no Brasil
O local escolhido não podia ser mais nobre, uma chácara a 300 m da Paulista, a nova avenida de São Paulo, com seus casarões e as linhas de bonde. Em meio à densa vegetação dos 19,8 mil m² do quadrilátero entre a rua Peixoto Gomide e as alamedas Jaú, Itu e Casa Branca, imigrantes italianos ergueram o prédio de sua primeira grande instituição de ensino no Brasil, o colégio Dante Alighieri, que acaba de ser tombado por sua importância histórica e arquitetônica.
Inaugurado em 1911, 20 anos após a avenida Paulista, foi projetado por Giulio Micheli, que chegara da Itália em 1888 e participara da reorganização de ruas do centro e da construção da Santa Casa de Misericórdia. Simultaneamente à escola, o arquiteto liderou as obras do viaduto Santa Ifigênia, que seriam finalizadas em 1913.
Pais de paletós e cartolas e mães com vestidos longos caminhavam pelas ruas de terra para levar e buscar os filhos. Eram 60 meninos e meninas os primeiros matriculados. Alguns deles, internos, vindos de outras cidades, usavam os dormitórios do pavimento superior, mantidos até a década de 1940.
Hoje, são 4.580 alunos alocados em cinco prédios, as mensalidades vão de R$ 2.100, no ensino infantil, a R$ 3.600, no médio, e o congestionamento de carros nos horários de entrada e saída em nada lembra a imagem bucólica do início do século passado, ainda que a vegetação do parque Trianon, em frente, remeta ao passado.
Mas a construção original, batizada de Leonardo da Vinci, preservou-se. Feita com tijolos aparentes nas paredes externas, tem a forma de “U”, com um pátio interno da mesma época, também tombado. Fechando o “U” e funcionando como passagem entre suas duas pontas está o outro edifício a ser preservado pela decisão do órgão estadual do patrimônio, o Condephaat, e do municipal, o Conpresp.
Chamado de Colmeia, por ter uma parede de elementos vazados com esse formato, de onde se vê o pátio e a parte de trás do prédio central, foi inaugurado em 1959. É um típico exemplar da arquitetura modernista brasileira, em contraste com a neoclássica europeia da edificação anterior.
O mesmo piso, um mosaico de pastilhas verdes e brancas, dá a volta pelo quadrado formado pelos dois prédios. No mais antigo, com um pé-direito de 5 m, as paredes têm a parte inferior revestida por mármore travertino. No alto, afrescos que remetem à cultura italiana. Entre os andares, vitrais dão iluminação colorida às escadas. O anexo moderno se sustenta em colunas inclinadas e paralelas, uma imagem que lembra Brasília. O vão livre é uma continuidade do pátio.
Na década anterior à construção, durante a Segunda Guerra, com Brasil e Itália em lados opostos, o colégio sofreu intervenção federal, foi proibido de usar a língua italiana e obrigado a se chamar Visconde de São Leopoldo. Após o conflito, a escola voltou ao nome original e reintroduziu o italiano, não em todas as aulas, como antes, mas no ensino de língua estrangeira.
Essa e tantas histórias da imigração italiana são preservadas pelo tombamento do conjunto, no qual a arquitetura revela sua capacidade de selar rupturas e unificar estilos distintos em uma oposição harmônica.
6 MOMENTOS HISTÓRICOS
1. O Dante Alighieri foi a primeira grande instituição de ensino dos imigrantes italianos no Brasil. Quando fundado, em 1911, o colégio tinha 60 alunos; hoje, são 4.580, até o ensino médio;
2. A filha do ditador italiano Mussolini, Edda, chegou a visitar o colégio. Em 1939, apesar de sua recepção ter sido uma ode ao fascismo, declarou que não falaria de política, em consonância com slogan do pai: “A mulher para o lar”;
3. O prédio construído para a inauguração e agora tombado foi projetado pelo italiano Giulio Micheli, responsável pelo viaduto Santa Ifigênia e pela Santa Casa, na região central;
4. Na Segunda Guerra Mundial, com Brasil e Itália em lados opostos, o colégio paulistano sofreu intervenção federal. Por isso, teve de mudar o nome para Visconde de São Leopoldo e foi proibido de usar a língua italiana;
5. Logo que foi fundado, começou uma coleção que forma seu museu de história natural, aberto a visitas agendadas de outras escolas. Tem 2.500 itens; entre eles, há um dragão-barbudo;
6. Entre 1943 e 1948, Jânio Quadros dava aulas no Dante. Contam que, certa vez, enervado com um aluno, o professor amante das mesóclises te-lo-ia posto para fora da sala pela janela –não o considerou digno de passar pela porta.
Fontes: Acervo Folha e Dante Alighieri
Originalmente publicado em Folha
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12 de março de 2022 at 12:14
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