Com cerca de 16 mil habitantes, Codogno nunca foi uma das cidades mais conhecidas da Itália, mas, há exato um ano, esse pequeno município da Lombardia viu seu cotidiano tranquilo ser chacoalhado por um organismo microscópico.
Era 20 de fevereiro de 2020 quando Mattia Maestri, então com 38 anos, deu entrada no Hospital de Codogno com sintomas de pneumonia. Apesar de o paciente nunca ter viajado à China, a médica Annalisa Malara decidiu submetê-lo a um exame molecular para o temido coronavírus Sars-CoV-2.
O resultado foi anunciado no dia seguinte e confirmou que Maestri (que sobreviveria depois de um mês internado) era o primeiro caso de contágio pelo vírus dentro das fronteiras da Itália, que já havia diagnosticado três infectados até então, mas todos eles importados da China.
“É como se tivesse caído um meteorito em nossas cabeças”, conta o prefeito de Codogno, Francesco Passerini, em entrevista à ANSA. “No início, pensava inconscientemente que tudo estivesse controlado, sem imaginar que, dali em diante, tudo mudaria”, acrescenta.
Apenas em 21 de fevereiro, as autoridades sanitárias da Itália detectaram cerca de 20 casos do Sars-CoV-2, incluindo a esposa e um amigo de Maestri, idosos que frequentavam um restaurante em comum e funcionários e pacientes do Hospital de Codogno.
Ainda tateando em um cenário que se revelaria devastador, o governo decretou lockdown imediato em Codogno e outras nove cidades vizinhas na Lombardia, além de Vo’, no Vêneto, que registraria, em 22 de fevereiro, a primeira morte por Covid-19 na Itália.
“Era uma situação estranha, quase incompreensível, mas que tinha todas as características de algo grave, o que me fez fechar imediatamente a nossa cidade para proteger a comunidade”, diz Passerini.
O lockdown de Codogno e das cidades vizinhas é até hoje, passado um ano, o regime mais rígido implantado na Itália para conter a pandemia, com toque de recolher válido durante todo o dia e bloqueios do Exército. Esse sistema vigoraria até 8 de março, quando o restante da Lombardia entrou em quarentena, porém sem toque de recolher.
“Agora, felizmente, sabemos mais sobre o vírus e sabemos que é possível vencê-lo, e temos inclusive uma arma a mais, que é a vacina. Queremos vencê-lo em memória daqueles que perderam esta batalha”, afirma o prefeito de Codogno.
Mortalidade
De acordo com números oficiais do governo, exatas 95.486 pessoas perderam a batalha contra a Covid-19 em um ano de pandemia na Itália.
Isso representa, segundo a Universidade Johns Hopkins, a sexta maior taxa de mortalidade pelo novo coronavírus em todo o mundo, atrás apenas de San Marino (que fica dentro da própria Itália), Bélgica, Eslovênia, Reino Unido e República Tcheca.
A primeira vítima confirmada foi o pedreiro aposentado Adriano Trevisan, de 78 anos, morador de Vo’, no Vêneto. Ele faleceu em 21 de fevereiro de 2020, em um hospital de Monselice, no mesmo dia de seu diagnóstico definitivo.
Com 3,3 mil habitantes, Vo’ implantou uma estratégia de isolamento e testagem em massa de sua população, o que permitiu identificar rapidamente as pessoas inicialmente infectadas: 89. Com isso, as autoridades conseguiram monitorar doentes e rastrear contatos, ajudando também a entender os mecanismos de disseminação do vírus.
Uma das constatações da experiência – hoje algo já sabido pela comunidade científica – é que assintomáticos também podem transmitir o Sars-CoV-2, já que a maioria das pessoas afetadas não apresentava nenhum sintoma.
“Naquele 21 de fevereiro de um ano atrás, soube da morte do paciente Trevisan enquanto voava para a Austrália. Cheguei lá e peguei um avião para voltar. Passei quatro dias em aviões”, conta o professor Andrea Crisanti, diretor de microbiologia e virologia da Universidade de Pádua, que transformou Vo’ em um laboratório para entender os mecanismos do novo coronavírus no início da pandemia.
No entanto, segundo ele, a Itália não aprendeu muito com o caso de Vo’, e a palavra de ordem para derrotar o Sars-CoV-2 é “rastreamento”. “Veja a Nova Zelândia: tiveram 25 casos positivos e fizeram 30 mil testes para rastrear o vírus”, afirma. A cidade vêneta perdeu seis moradores para a Covid-19 e hoje contabiliza apenas um infectado.
O primeiro aniversário da morte de Trevisan será lembrado neste domingo com a plantação de uma oliveira em uma rotatória de Vo’.
“Podíamos ter tido muito mais mortes. Aprendemos a importância da distância e do respeito recíproco, e todos os anos recordaremos aquele dia”, diz o prefeito Giuliano Martini. (ANSA)
Por ANSA