O italiano Vincenzo Filizola chegou aos 15 anos ao Brasil e fez história com seu espírito empreendedor. Até hoje seu nome é sinônimo de balanças no país.
A história conta que o jovem Vincenzo desembarcou no Rio de Janeiro em 1882, aos 15 anos, a bordo do navio Ile de France. Ele vinha da cidade de Torraca, localizada na província de Salerno, na região da Campania, na Itália.
Os objetivos de Vincenzo, já com o nome “traduzido” para Vicente no Brasil, eram os mesmos de milhares de imigrantes que vieram para o Brasil na mesma época. Ele buscava melhores oportunidades de trabalho e também formar uma família na sua nova terra.
No Rio de Janeiro, Vicente permaneceu trabalhando durante dois anos como auxiliar em casas de ferragens, período que aproveitou para aprender a língua portuguesa. Enquanto isso, é claro, aprendia a fabricar peças de metal, como trincos e fechaduras.
Em São Paulo, nasce uma ideia
Em 1884, Vicente se mudou para São Paulo, onde já estava morando seu tio, Pedro Gaetano, que o ajudou a montar uma pequena serralheria. No local, o jovem imigrante italiano iniciou a fabricação de fechaduras e trincos para portas.
Mas o destino reservava algo muito maior para Vicente Filizola, e em 1886 ele bateu à sua porta, na figura de um cliente com um pedido especial. O cliente apresentou ao serralheiro uma balança do tipo Roberval, importada da França, e solicitou o conserto do equipamento.
Vicente se recusou, por desconhecer sua técnica de construção e o procedimento correto para consertá-lo. No entanto, diante da insistência do cliente, acabou prometendo fazer o que estivesse ao seu alcance.
Não existiam balanças de fabricação nacional, por isso, dominar o conserto dessas máquinas era fundamental para o comércio em geral. Tratava-se de um conhecimento altamente tecnológico e estratégico no contexto do Brasil que se desenhava naquele período.
Colocando em prática todos os conhecimentos obtidos desde sua chegada ao Brasil, o italiano acabou conseguindo consertar o equipamento. No entanto, não avisou o cliente até que tivesse copiado peça por peça da balança, da melhor forma que conseguiu.
Foi assim que, depois de produzir todas as peças a partir dos modelos da balança francesa entregue por aquele cliente, Vicente Filizola criou a primeira balança de fabricação 100% nacional.
Filizola conquista o mercado
Como era de se esperar, as balanças Filizola rapidamente conquistaram o mercado. O capricho do talentoso italiano garantiu que as balanças fossem tão precisas quantos as importadas, por um preço consideravelmente menor. Estava pronta a fórmula do sucesso.
Vicente passou a fabricar as balanças por encomenda, mas como a procura só aumentava, foi obrigado a montar uma oficina em sua própria casa, na Rua da Consolação, em frente ao prédio da Biblioteca Municipal de São Paulo.
No dia 5 de abril de 1886 nascia oficialmente a V. Filizola & Gaetano, empresa que logo seria modificada para Filizola & Co. Ltda, primeira indústria nacional de balanças.
Ainda por meio de produção completamente artesanal, em 1890 a indústria já empregava 40 pessoas. Nessa época, Vicente era casado com Carmela Caetano Filizola e, nos anos seguintes, começou a agregar os filhos à empresa.
O primeiro foi o filho mais velho, Nicola, ou Nicolau, na forma abrasileirada, formado em engenharia pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Depois vieram Pedro e Aurélio, que também deram continuidade aos negócios.
Nova fábrica, novos produtos
Como o pequeno sobrado da Rua Consolação ficou pequeno para as operações da empresa, em 1920 foi inaugurada uma nova fábrica, mais ampla e moderna, no bairro do Canindé, em São Paulo.
Em 5 de abril de 1936, com a comemoração de 50 anos da empresa, a Filizola passou a fabricar os primeiros cortadores manuais e as primeiras balanças semiautomáticas vermelhas, que se consagraram por anos como marca registrada da marca.
Em 1942, o patriarca e fundador da empresa, Vicente Filizola, morreu aos 75 anos. Desse modo, a presidência ficou a cargo de seu primogênito Nicolau.
Em 1946, a comemoração de 60 anos da Filizola aconteceu em um almoço na Brasserie Paulista, na Praça Antônio Prado, de propriedade do também imigrante italiano Vittorio Fasano.
A construção de um legado
Dois anos depois, Nicolau mandou construir no local onde foi a primeira fábrica da Filizola um prédio com o nome de Edifício Vicente Filizola, em homenagem ao pai. No térreo, ficava uma loja da própria empresa.
No ano de 1951, a empresa comemorou a marca de 500 mil balanças produzidas, Dois anos depois, começou a fabricar os primeiros cortadores elétricos do mercado.
Em 1966, a Filizola se transfere do bairro do Canindé para uma nova unidade de 20 mil metros quadrados, no bairro do Pari, na Rua Joaquim Carlos, 1236.
Em 1979, a Filizola começaria a fabricar e comercializar a primeira balança eletrônica da América Latina, que foi denominada 1005. A partir dos anos 80, a Filizola passou a produzir leitores e impressoras de códigos de barras, a Tp-30, que podia ser interligada às suas balanças comerciais.
No ano de 1998, a Filizola homologou no Inmetro e anunciou o lançamento do modelo que a colocaria no cenário de automação comercial, a Filizola Platina.
Filizola e a história que não terminou
Entre 2004 e 2005, a Filizola montou duas novas fábricas em Mato Grosso e começou a vender pela internet. A partir de 2008, sob comando da quarta geração da família, a empresa tentou uma restruturação e profissionalização de gestão, mas com a crise global, a saúde financeira do grupo começou a se deteriorar.
Em 2012, com 280 funcionários e duas unidades fabris em Campo Grande (MS), a Filizola entrou em recuperação judicial. Em 2014, com R$ 25 milhões em dívidas, foi decretada a falência da companhia, após quatro gerações e 128 anos de liderança absoluta no setor de pesagem.
Ao todo, foram mais de 2,5 milhões de balanças fabricadas. Em qualquer canto do Brasil pode ser encontrado um equipamento Filizola sobre um balcão de padaria, açougue ou estante de farmácia, academia e hospital.
É uma história que seguirá viva por muitos anos, levando adiante o nome daquele imigrante italiano que desembarcou no Rio de Janeiro aos 15 anos, cheio de sonhos e com muita vontade de trabalhar.
Por Roberto Schiavon | Italianismo