Os brasileiros que visitam a Itália para apreciar a famosa culinária muitas vezes acredita que todos os italianos são “sortudos” e apaixonados por lasanha, massas como a amatriciana, bolonhesa e enormes pizzas. No entanto, isso pode estar mudando. Uma nova tendência gastronômica está surgindo.
“Estou percebendo que cada vez mais italianos têm procurado cozinhas exóticas, fugindo dos pratos icônicos que nos definem”, diz a jornalista romana Silvia Marchetti.
Segundo Marchetti, muitos italianos estão se aventurando por cozinhas libanesa, chinesa, japonesa, mexicana, indiana e até africana, em busca de alternativas aos pratos tradicionais.
Uma pesquisa recente do jornal Il Sole 24 Ore revelou que 41% dos italianos entre 28 e 45 anos gostariam de ver uma maior variedade de alimentos estrangeiros nas prateleiras dos supermercados, enquanto apenas 10% preferem mais produtos regionais italianos.
O carrinho de compras está mudando
Enquanto os produtos tradicionais italianos estão perdendo espaço, o consumo de produtos étnicos está em alta.
Só em 2023, a distribuição de alimentos estrangeiros movimentou € 600 milhões, um aumento de 7% em relação ao ano anterior. Entre os produtos que mais conquistam os italianos estão os nuggets de frango ao estilo americano, preferidos por 72% da população, kebab por 71%, e sushi, que já agrada 66% dos italianos.
Apesar de a Itália ser o maior produtor de arroz da Europa, ao lado da Espanha, o arroz mais vendido agora é o basmati, com 25 mil toneladas comercializadas em 2023.
Além disso, o sushi domina o mercado de comidas internacionais, com vendas nos supermercados atingindo € 150 milhões. Macarrão instantâneo, cuscuz, paella e chips mexicanos também estão em ascensão.
Essa mudança nos hábitos alimentares está pressionando as indústrias alimentícias a oferecerem mais opções internacionais, em detrimento de pratos italianos tradicionais.
O mesmo fenômeno pode ser observado nos restaurantes. “Na minha região, ao norte de Roma, três restaurantes chineses-japoneses abriram nos últimos dois anos e estão sempre lotados. Nos finais de semana, as famílias lotam esses estabelecimentos, enquanto as tratorias familiares tradicionais estão vazias”, relata Marchetti.
Embora o consumo de alimentos estrangeiros tenha se popularizado tardiamente na Itália, só a partir dos anos 2000, a novidade de experimentar sabores diferentes continua atraindo muitos italianos, especialmente os mais jovens. Além disso, a grande diversidade de pratos regionais italianos pode ter atrasado o surgimento dessa tendência exótica.
Para Marchetti, essa mudança não se deve apenas à globalização. Muitas famílias italianas estão se cansando das receitas passadas de geração em geração, e cada vez menos dispostas a cozinhar. “Hoje, a falta de tempo e a preferência por atividades como ir à academia parecem ser fatores que contribuem para a diminuição do tempo dedicado à cozinha”, diz.
A crise das tradições culinárias
“Muitos amigos meus pedem comida chinesa ou libanesa para viagem três vezes por semana e substituíram as geleias caseiras para os filhos por manteiga de amendoim ao estilo americano. Recentemente, fiquei surpresa ao ver comerciais de TV sobre manteiga de amendoim feita por empresas italianas”, conta a jornalista.
Para ela, a cultura culinária italiana está enfrentando uma crise que tende a se agravar. A autenticidade e a lealdade às receitas das avós estão desaparecendo, e isso ocorre principalmente por conta do estilo de vida acelerado que está substituindo o tradicional ritmo desacelerado da vida italiana, tão admirado pelos estrangeiros.