Uma das maiores operações anticorrupção da história europeia, a Mãos Limpas, ou Mani Pulite, realizada, nos anos 90, ajudou a desmantelar diversos esquemas envolvendo tanto o pagamento de propina por empresas privadas interessadas em garantir contratos com estatais e órgãos públicos quanto o desvio de recursos para o financiamento de campanhas políticas.
Mas para o cientista político Alberto Vannucci, um dos maiores estudiosos da Operação “Mãos Limpas” na Itália, as investigações judiciais não conseguem acabar com a corrupção em um país quando ela é sistêmica.
“Inquéritos judiciais, mesmo quando bem-sucedidos, podem colocar na cadeia alguns políticos, burocratas e empresários corruptos, mas não conseguem acabar com as causas enraizadas da corrupção”, disse o professor da Universidade de Pisa.
Segundo ele, a Mãos Limpas italiana ainda acabou permitindo o surgimento de mecanismos mais sofisticados de corrupção no país.
A operação investigou seis ex-premiês, mais de 500 parlamentares e milhares de outros agentes.
Os principais partidos da época – Primeira República Italiana, Democracia Cristã (DC) e o Partido Socialista Italiano (PSI) – acabaram ou foram profundamente modificados por ela.
A operação também teve como resultado a ascensão de políticos “novos” como o ex-premiê Silvio Berlusconi, que se envolveu em diversos escândalos e acabou renunciando.
“A Mãos Limpas pode ser considerada uma conquista incrível em curto prazo, mas um fracasso em longo prazo”, disse Vannucci em entrevista a BBC Brasil.
Segundo ele, em termos gerais, inquéritos judiciais, mesmo quando bem-sucedidos, podem colocar na cadeia alguns políticos, burocratas e empresários corruptos, mas não conseguem acabar com as causas enraizadas da corrupção.
“A falta de transparência e responsabilidade em política e na burocracia estatal, o controle social e político fraco sobre o exercício de poder, mecanismos de seleção da elite política errados e imorais: esses e outros fatores de corrupção não podem ser erradicados por juízes”, explicou.
Para piorar, na Itália, agora, os políticos corruptos, servidores públicos e empresários aprenderam a lição da Mãos Limpas e não estão cometendo os mesmos erros daqueles que foram presos.
“Nos últimos anos, eles desenvolveram técnicas mais sofisticadas para praticar corrupção com mais chances de ficarem impunes, como dissimular pagamentos de propinas, ou multiplicar conflitos de interesses, como fez (o ex-premiê) Berlusconi (ao criar tensões com o Judiciário)”, diz Vannucci.
Para ele, “mesmo quando acham provas de propina e processam políticos, investigações judiciais só arranham a superfície da ilegalidade, mal podem modificar a estrutura invisível das normas não escritas da corrupção sistêmica”.
E completa: “quando uma parte significativa dos membros da elite desenvolvem uma crença de que “a corrupção é a forma normal de fazer as coisas”, a prática da corrupção resiste a investigações e escândalos”.