A tarefa primeira do jornalista é garantir o direito das pessoas à informação verdadeira e autêntica, sem distorções
Não. A Itália não vai cancelar 30 mil processos de cidadania italiana. A Itália está sim, e com louvor, investigando quem cometeu crimes.
Diferente dos especuladores de plantão, a justiça italiana é capaz de separar os criminosos falsificadores de certidões, ou de qualquer outro documento, daqueles que estão sendo chamados no Brasil de “coiotes” ou “mafiosos da cidadania” porque – segundo a visão do ministério publico italiano – fizeram residência ilegal.
Por conta da falta de ação do Estado Italiano que não cria regras claras para o processo de cidadania, a questão da residência – um dos requisitos para os que têm direito à cidadania italiana para pleitearem o reconhecimento em solo italiano – passa a ser interpretativa.
E, seguramente, em uma discussão no tribunal, o cidadão é inocentado.
No ano passado, uma sentença proferida pelo Tribunal de Lucca, na Toscana, deixou claro que a residência temporária na Itália para o processo de cidadania italiana não é ilegal.
O colegiado composto por três juízes – porque o tipo de crime denunciado (l’abuso d’ufficio) prevê esta composição – foram unânimes em dizer que, apesar da obrigatoriedade da inscrição da residência do requerente no município (comune), o conceito “residência” para os que vão para a Itália para fazer o processo não deve ser a mesma do código civil italiano. Porque esse requerente não é ainda um cidadão italiano reconhecido.
O juízes consultaram o Ministério do Interno, o mesmo que criou as circulares que regulamentam o processo de cidadania.
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Leia um trecho da sentença:
“La circostanza che l’iscrizione all’anagrafe implica una attestazione di residenza, non significa necessariamente che il concetto di residenza utile ai fini delle pratiche di riconoscimento della cittadinanza “jure sanguinis” sia quello del codice civile, e che pertanto si debba far riferimento ad una stabile abituale dimora del soggeto (che nel caso di specie ovviamente non esisteva).
“A circustância de que o registro no município implica uma prova de residência, não significa necessariamente que o conceito de residência útil para fins da prática de reconhecimento de cidadania” jure sanguinis” seja aquela do código civil, e que, portanto, deve ser feita referência a uma residência habitual estável do sujeito (que neste caso obviamente não existiu).
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A promotoria pública italiana, responsável pela acusação, não entrou com recurso.
A sentença abre jurisprudência para casos onde clientes e profissionais que os assessoram, denunciados, possam ser absolvidos.
Ainda na sentença, segundo os magistrados, o prazo de conclusão do processo de reconhecimento da cidadania italiana não deve ser contestado se todos os requisitos foram cumpridos. “É justificável que processos administrativos sejam concluídos de forma rápida”.
Uma interpretação que vai contra àquilo que está sendo publicado na imprensa brasileira, que equivocada não se esforça para saber que a cidadania italiana é um direito adquirido, e a Lei na Itália é respeitada.
A Itália não vai cancelar 30 mil cidadanias. Mesmo que esse seja o desejo de quem deveria defender o seus compatriotas.
A tarefa primeira do jornalista é garantir o direito das pessoas à informação verdadeira e autêntica, sem distorções. Sem interesses escusos.
Para isso, o bom jornalismo exige que as suas fontes sejam checadas, que os dados, fatos e processos sejam conferidos.
Um bom jornalismo deve ser feito com responsabilidade.
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