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Cidade italiana famosa pela cerâmica se empolga com a possibilidade de voos suborbitais

Um voo suborbital da Virgin deve custa US$ 250 mil (R$ 937 mil)

Autoridades locais afirmam que Grottaglie está pronta e tem muito a oferecer aos turistas

Depois de descer correndo uma pista de quase 4 km, uma van carregando membros da diretoria do aeroporto parou sobre um pedaço de asfalto infestado de mato alto, flores silvestres e ervas.

“Ah, olha o cheiro desse orégano”, disse Antonio Maria Vasile.

“Isso é funcho selvagem”, respondeu seu chefe, Marco Franchini.

“Não, é orégano”, resmungou Vasile, enquanto Franchini saía da van e anunciava: “Chegamos. Este é o Porto Espacial”.

Grottaglie, uma cidadezinha medieval conhecida principalmente por sua cerâmica artesanal, está se preparando para decolar.

Em julho, empresas aeroespaciais italianas assinaram um contrato com a Virgin Galactic para levar turistas espaciais que tenham cerca de US$ 250 mil (R$ 937 mil) para gastar em voos suborbitais que oferecem uma vista da curvatura da Terra e cerca de cinco minutos de mínima gravidade.

Quarenta e seis pontos em todo o país foram considerados para a honra de servir como nova plataforma de lançamento. Em maio, o Ministério dos Transportes da Itália decidiu que Grottaglie, de 35 mil habitantes, com sua longa pista, clima estável e histórico como banco de ensaio para helicópteros pilotados remotamente e outras naves não tripuladas, seria ideal.

Na segunda-feira (30), o primeiro-ministro da Itália, Giuseppe Conte, esteve ao lado do presidente Donald Trump na Casa Branca e usou a grande ocasião para falar sobre “lançar, o mais breve possível, novos aviões que, ao cruzarem a atmosfera, serão capazes de conectar a Itália e os Estados Unidos em uma hora e meia”.

“Não tem ninguém mais rindo”, disse Michele Emiliano, presidente da região, que foi representado em uma caricatura flutuando no espaço em um traje extra-grande de astronauta.

Se tudo sair de acordo com o planejado, a White Knight 2 da Virgin carregará a SpaceShip Two Unity até cerca de 65 mil pés de altitude, onde uma nave menor se separará, acelerará e subirá a 100 km acima do nível do mar até a linha de Kármán, entre a atmosfera terrestre e o espaço.

Richard Branson, o bilionário fundador da Virgin, disse que 600 pessoas estão na fila de espera para decolar da plataforma de lançamento original no Novo México no próximo ano, e cerca de dois anos depois na Itália, embora atrasos, acidentes e cancelamentos tenham adiado a partida em mais de uma década.

O ceramista Salvatore Santoro trabalha em Grottaglie, na Itália. (Stephanie Gengotti/The New York Times)

No entanto, esta região da Puglia, lugar de nascimento de José de Cupertino, o santo do século 17 padroeiro dos astronautas, por seu hábito aparente de levitar durante um estado de transe, está esperançosa.

Ela também precisa de um renascimento econômico. Situada a alguns quilômetros de distância de Grottaglie, a maior usina siderúrgica da Itália, a ILVA, é uma dor de cabeça política e um desastre ambiental que dispersa poeira vermelha tóxica em seu entorno; seu fechamento poderia acabar com 20 mil postos de trabalho.

Então Emiliano, talvez mais conhecido por ter se machucado enquanto dançava tarantela e por travar uma custosa guerra civil dentro de seu Partido Democrático, prevê que Grottaglie será uma espécie de “Vale do Silício” do espaço europeu, com 40 voos suborbitais por ano.

Muitos italianos acham o projeto quixotesco. Mas simpatizantes falam na possibilidade de uma indústria secundária de simuladores de voo, viagens de pesquisas especiais, lançamentos de pequenos satélites, pesquisas acadêmicas e uma frota italiana de naves especiais suborbitais copiadas da Virgin.

Emiliano também está contando com os visitantes abastados que se hospedariam nos luxuosos hotéis-fazenda da Puglia durante o treinamento.

“Não queremos, digamos, fileiras de guarda-sóis e cadeiras de praia”, ele disse. “Queremos ter pessoas de alta qualidade”.

Já existem alguns bolsões na Puglia com uma frequência de ricos e famosos. Funcionários do aeroporto de Grottaglie, que não tem mais voos comerciais, mas recebe voos fretados, já deram as boas-vindas aos Kennedys, a cineastas de Hollywood e à Madonna, que aterrissou aqui em um “avião dourado”, disse Franchini, que mostrou uma foto sua com Branson no celular, ambos usando camisas brancas de gola aberta.

“Nós nos demos bem de cara por causa do kitesurf”, ele disse.

Os habitantes da cidade esperam que um número ainda maior de pessoas da alta sociedade venha atrás do voo suborbital de duas horas e meia de Los Angeles até Grottaglie, descrito por Emiliano. (“Eu seria muito prudente quanto a isso”, disse Vincenzo Giorgio, da Altec, uma das empresas italianas parceiras da Virgin.)

Emiliano reconheceu que essa viagem, que chega a uma velocidade de 6g, ou seis vezes a aceleração da gravidade, poderia ser “meio estressante” para os passageiros. Mas a redução do tempo de voo seria revolucionária para o envio de cargas, embora não no caso das preciosas cerâmicas de Grottaglie.

“Elas são lindas”, ele disse, “mas não há pressa”.

O que ele tinha em mente eram os hortifrúti da Puglia. “Você já comeu um figo fresco?”, perguntou. “Um figo da Puglia, se chega fresco a Los Angeles, pode custar de 6 a 7 euros (R$ 26 a 31)!”

Mas nem todos estão felizes com a ideia.

Em frente à sua loja de cerâmica, embaixo de uma grande placa de cerâmica onde se lê “Bairro da Cerâmica”, Giuseppe Santoro disse duvidar que o projeto fosse ser aprovado e que, mesmo que isso acontecesse, não achava que a cidade se beneficiaria economicamente de qualquer atividade no aeroporto. “Estamos em outro mundo”, ele disse.

Santoro lamentou que um acordo que recebeu atenção parecida há mais de uma década, com a empresa americana Boeing para fazer a fuselagem do 787 Dreamliner nos hangares de Grottaglie, não tenha criado o prometido boom turístico.

“Eles nos trouxeram este deserto”, ele disse, gesticulando na direção das ruas curvas vazias.

Outros ceramistas do bairro estão preocupados com o aumento nos aluguéis e com a poluição sonora. Alguns estão mais dispostos a dar uma chance.

“Esperamos que aconteça”, disse Enza Fasano, uma mestre ceramista do respeitado império da cerâmica Fasano. Mas ela acrescentou que a prefeitura tinha muito trabalho pela frente, inclusive melhorar suas opções de hospedagem. Ela me perguntou onde eu estava hospedado e me disse: “Sua pousada é terrível”.

Seu marido, Salvatore Santoro, disse ainda que a prefeitura deveria organizar passeios no bairro da cerâmica. Ele disse que se as pessoas estavam dispostas a gastar US$ 250 mil em um “voo exorbital, ou sei lá como chamam”, então elas “poderiam gastar 100 euros em cerâmica”.

Autoridades locais afirmam que Grottaglie está pronta e tem muito a oferecer aos turistas. Além de cerâmica, Grottaglie também produz uvas e mosquiteiros, disse Vincenzo Quaranta, vice-prefeito da cidade e ex-controlador de tráfego aéreo.

Ele mostrou seu castelo do século 14, contendo cerâmica do século 4 a.C. Em um convento desativado, ele apontou para seus favoritos em uma exposição internacional de cerâmica, que incluía o trabalho de um artista local que consistia de reproduções em cerâmica de bitucas de cigarro, garrafas de cerveja, embalagens de preservativos e cotonetes espalhadas pelo chão.

Mario Bonfrate, maior autoridade do turismo da cidade, disse ainda que Grottaglie também tinha quadras de tênis e cultura. Ele observou que Peter Murphy, um cantor inglês conhecido como padrinho do gótico, faria na cidade seu único show na Itália, em agosto.

A Itália ainda precisa aprovar uma legislação que permita as viagens suborbitais. Mas a cooperação com a Autoridade da Aviação Federal dos Estados Unidos e o apoio do governo italiano encorajaram Giorgio, o executivo da Altec.

Ele disse que pesquisas de mercado haviam demonstrado que existe muita demanda e que as partidas de Grottaglie seriam complementares, mais do que concorrentes de sua prima americana. “O panorama seria um pouco diferente”, acrescentou. “No Novo México, a situação é mais um deserto”.

Tudo isso parece meio esquisito.

O saguão de check-in ocioso do aeroporto, que tem até balanças analógicas para pesar bagagens e pôsteres desbotados das estimadas cerâmicas de Grottaglie, parece ter parado no tempo.

Enquanto rajadas de vento passavam sobre o telhado de construções em obras que virarão escritórios para as viagens suborbitais (“É estranho que tenha vento hoje”, disse Vasile, diretor do aeroporto), Franchini mostrava um hangar aberto e reformado e explicava como ele abrigaria a nave espacial da Virgin.

“Feche os olhos”, ele disse, “e imagine”.

 


Jason Horowitz, mm Grottaglie. Via UOL

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